Resumo:A eleição presidencial americana ocorre na primeira terça-feira após a primeira segunda-feira de novembro, tradição que remonta ao século XIX. Originalmente, essa escolha considerava uma sociedade agrícola e religiosa. Hoje, esse sistema é questionado, com propostas de modernização para facilitar o acesso ao voto e refletir a realidade moderna dos EUA.

Por Que as Eleições nos EUA Ocorrem em uma Terça-feira de Novembro? Desvendando a História Pouco Conhecida da Eleição Presidencial
As eleições presidenciais nos Estados Unidos seguem um cronograma específico e peculiar: são realizadas sempre na primeira terça-feira após a primeira segunda-feira de novembro. Embora hoje isso pareça apenas uma regra convencional, essa escolha de dia, semana e mês tem raízes profundas na história americana e reflete aspectos culturais, econômicos e religiosos do século XIX. Para entender o motivo dessa escolha, precisamos voltar ao passado e explorar as complexidades de uma sociedade rural e agrícola que buscava formas de adaptar-se ao crescimento do país e de seu sistema eleitoral.
1. O Cenário Agrícola dos Estados Unidos no Século XIX
Nos anos 1800, a economia dos Estados Unidos era fortemente rural e dependia da agricultura, o que significava que as famílias gastavam a maior parte de seu tempo cuidando de suas fazendas e gado. O período de colheita, que ia de setembro até o início de novembro, era extremamente movimentado, pois as famílias precisavam aproveitar ao máximo a temporada para garantir alimento para o inverno. Por isso, a ideia de realizar eleições em setembro ou outubro era impraticável para a maioria da população, pois isso interferiria diretamente nas atividades de colheita e nos compromissos agrícolas.
Além disso, novembro era um mês estratégico, pois marcava o fim das colheitas e o início de uma temporada mais tranquila nas fazendas. Com as colheitas finalizadas e o inverno apenas começando, o mês oferecia uma janela ideal para que os eleitores deixassem suas casas e viajassem até os locais de votação.
2. A Escolha da Terça-feira: Religião e Viagens
A terça-feira foi escolhida como um dia que conciliava as necessidades religiosas e as limitações de transporte da época. No século XIX, a maioria dos americanos observava o domingo como um dia de descanso e adoração. Para aqueles que precisavam viajar para votar, especialmente nas áreas rurais, sair de casa na segunda-feira de manhã permitia que chegassem ao local de votação até a terça-feira, sem violar o descanso dominical.
Outro fator importante foi a infraestrutura de transporte limitada. As estradas eram, muitas vezes, pouco desenvolvidas e em condições adversas, principalmente com o início do inverno. Viajar para a cidade ou vila mais próxima, que podia estar a quilômetros de distância, era uma jornada que exigia tempo e planejamento. Realizar a eleição em uma terça-feira permitia que os eleitores retornassem às suas fazendas ainda na semana útil, preservando o sábado para os preparativos religiosos do domingo.
3. Por Que Não Uma Segunda-feira ou Quarta-feira?
Uma questão que surge ao analisar a escolha do dia é: por que não segunda ou quarta-feira? Cada uma dessas opções oferecia inconvenientes específicos. A segunda-feira obrigaria muitos eleitores a viajar no domingo, interferindo nos costumes religiosos. Por outro lado, a quarta-feira era, em algumas regiões, um dia de mercado, quando os agricultores vendiam produtos e compravam suprimentos. Como o mercado local era crucial para a economia agrícola, realizar a eleição em uma quarta-feira poderia prejudicar tanto os agricultores quanto os comerciantes locais.
4. A Primeira Terça-feira Após a Primeira Segunda-feira: Evitando o Dia 1º
Ao definir o dia da eleição como a “primeira terça-feira após a primeira segunda-feira de novembro”, o Congresso estabeleceu que as eleições jamais ocorreriam no dia 1º de novembro. Esse cuidado foi adotado para evitar que o dia da eleição coincidisse com o Dia de Todos os Santos, uma celebração religiosa significativa para muitos cristãos. Além disso, o início de novembro era um período em que muitos agricultores ainda finalizavam tarefas relacionadas à colheita e estavam envolvidos em atividades econômicas do final do mês.
Outro aspecto prático de evitar o dia 1º foi o fato de que muitos negócios fechavam suas contas no final do mês. Começar o novo mês com o dia de eleição poderia criar complicações logísticas para comerciantes e bancos. Dessa forma, a primeira terça-feira após a primeira segunda-feira de novembro tornou-se a escolha lógica e prática para os Estados Unidos.
5. O Papel da Expansão dos Estados Unidos e a Uniformidade Eleitoral
À medida que os Estados Unidos expandiam suas fronteiras e mais estados ingressavam na União, era necessário estabelecer um sistema uniforme de votação. Com diferentes estados votando em dias variados, a possibilidade de manipulação e fraude aumentava, já que os resultados poderiam influenciar os eleitores em regiões onde a eleição ainda não havia ocorrido. Ao padronizar a data, o Congresso buscou garantir que todos os estados votassem ao mesmo tempo, promovendo uma eleição mais justa e equitativa.
Essa uniformidade também visava consolidar a identidade nacional, fortalecendo a ideia de uma eleição unificada para eleger um presidente comum a todos os estados. Em 1845, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma lei que formalizou a terça-feira de novembro como o dia das eleições presidenciais, uma data que permanece em vigor até hoje.
6. O Impacto da Tecnologia e da Urbanização na Tradição Eleitoral
Com o avanço da tecnologia e o desenvolvimento dos meios de transporte e comunicação, a justificativa original para realizar as eleições em uma terça-feira de novembro tornou-se menos relevante. O surgimento de ferrovias, automóveis e, posteriormente, aviões facilitou o deslocamento dos eleitores, enquanto as mudanças na economia e a urbanização reduziram a dependência da agricultura. A transformação dos Estados Unidos em uma nação industrializada e urbana questionou a tradição de um sistema eleitoral criado para uma sociedade rural.
Hoje, muitos argumentam que o sistema eleitoral precisa ser reformado para refletir as realidades modernas. A terça-feira, dia útil, não é mais conveniente para a maioria dos americanos, que trabalham em horários fixos e podem ter dificuldades para votar durante a semana. Com isso, crescem as propostas para instituir o “voto antecipado” ou um “feriado eleitoral” que permita aos eleitores exercerem seu direito de voto sem comprometer suas atividades diárias.
7. O Movimento para Modernizar as Eleições
Diversas iniciativas foram propostas ao longo dos anos para modernizar as eleições americanas. Uma delas é a mudança para o voto no fim de semana, permitindo que mais eleitores compareçam às urnas. Alguns defensores sugerem o estabelecimento de um feriado nacional, o que facilitaria a participação e reduziria a pressão sobre os locais de votação, diminuindo as longas filas e promovendo um ambiente mais inclusivo.
Outra proposta é a implementação do voto eletrônico e do voto por correio em larga escala, algo que se intensificou durante a pandemia de COVID-19. Em 2020, muitos estados expandiram o acesso ao voto por correspondência para evitar aglomerações, e a medida foi amplamente adotada, demonstrando que alternativas ao sistema tradicional podem ser eficazes e seguras.
8. Reflexões Finais sobre uma Tradição em Mudança
A história do “dia da eleição” nos Estados Unidos é um reflexo das mudanças profundas na sociedade americana ao longo dos séculos. O que começou como uma tentativa de acomodar uma população agrícola e religiosa no século XIX tornou-se, para muitos, uma tradição desatualizada e até mesmo um obstáculo ao exercício pleno da democracia.
À medida que os Estados Unidos continuam a evoluir, as discussões sobre a reforma eleitoral ganham força. Adaptar o sistema eleitoral às necessidades da população moderna exige uma revisão cuidadosa das práticas e tradições estabelecidas. Embora a terça-feira de novembro tenha servido bem aos eleitores do passado, o futuro da democracia americana pode exigir uma abordagem mais flexível e inclusiva.
A escolha do dia das eleições presidenciais, embora um detalhe aparentemente trivial, ilustra a complexidade de um sistema democrático que busca equilibrar tradição e modernidade. Se no século XIX as preocupações com a agricultura, a religião e o transporte moldaram essa decisão, hoje o desafio é criar um sistema eleitoral que promova a máxima participação de todos os cidadãos, refletindo as necessidades de uma sociedade diversa e em constante transformação.
Em última análise, o debate sobre o dia da eleição revela o compromisso dos Estados Unidos com a democracia e com a busca contínua por um sistema que represente melhor o seu povo. Seja através do voto por correio, de feriados eleitorais ou de outras reformas, a história das eleições presidenciais mostra que, em uma democracia, até mesmo as tradições mais antigas podem e devem ser questionadas em prol de um futuro mais inclusivo e participativo.
